Especialistas discutem diversos aspectos da atuação em defesa da vida no Congresso Nacional do Júri
Nesta quinta-feira, 5 de outubro, temas de grande relevância para a comunidade jurídica e para a sociedade foram discutidos por especialistas durante o Congresso Nacional do Júri. O evento, que teve início na noite desta quarta-feira, 4 de outubro, é realizado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional e da Coordenadoria do Tribunal do Júri (Cojur), no Auditório da Escola Superior de Direito Dom Helder Câmara, em Belo Horizonte, até amanhã, 6 de outubro.
O encontro reúne integrantes do Ministério Público de todos os estados brasileiros para debater as perspectivas e os desafios de atuação no Tribunal do Júri. A programação conta com diversas palestras, ministradas por especialistas em temas ligados à atuação no Júri, além de exposição de teses destinadas ao fortalecimento da atuação do Ministério Público na defesa do direito à vida.
A primeira palestra deste segundo dia de evento foi ministrada pelo procurador de Justiça do MPMG André Estevão Ubaldino Pereira. O palestrante falou sobre o tema “Crimes contra a vida e foro por prerrogativa de função”. A mesa foi presidida pelo procurador de Justiça do MPMG Carlos Augusto Canedo e teve como debatedor o desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Carlos Henrique Perpétuo Braga.
André Ubaldino iniciou sua fala destacando a profunda paixão que sente pelo júri e, na sequência, discorreu sobre alguns casos em que atuou. Segundo o palestrante, é comum que a posição dos promotores de Justiça, na defesa pela vida, conflite com os interesses do poder público e da opinião popular. “No entanto, não podemos nos esquecer que estamos aqui para fazer Justiça, como o próprio nome do cargo indica. Não somos mais promotores públicos, mas promotores de Justiça. Quando não há prova suficiente para a condenação, pedimos a absolvição do réu”, pontuou.
O desembargador Carlos Henrique Perpétuo reforçou o compromisso dos profissionais do Júri com a lei e com a Justiça. “É preciso estudar a fundo o processo para fazer o julgamento com segurança. Não somos justiceiros. Queremos fazer justiça com base no processo penal. Temos que garantir o devido processo legal”, defendeu.
Na segunda palestra da manhã, a promotora de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) Simone Sibílio do Nascimento falou sobre a atuação do MP no plenário do júri em casos envolvendo organizações criminosas e também sobre o papel da vítima no processo penal. A mesa foi presidida pelo coordenador das Promotorias de Justiça do Tribunal do Júri do MPMG, promotor de Justiça Cláudio Maia de Barros, e teve como debatedor o promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo Aluísio Antônio Maciel Neto.
Simone iniciou a palestra destacando o papel do Ministério Público para transformar a vítima em sujeito de direitos. “O que nós, promotores de Justiça, estamos fazendo na prática para deixar de neutralizar essas pessoas e dar a elas a devida visibilidade?”, questionou, já nos primeiros momentos da palestra. Segundo a promotora, é fundamental que o MP trabalhe pela garantia dos direitos de informação, participação, proteção e reparação das vítimas.
Simone também compartilhou com o público práticas usadas pelo MPRJ nos casos envolvendo organização criminosa e ressaltou a importância do congresso para o aperfeiçoamento da atuação dos promotores no Júri. “Quando a gente se reúne, a gente troca ideias, sugestões, compartilha práticas de atuação, visando o bem da sociedade. É necessário que haja uma interoperabilidade de atuação pelas instituições”.
Ao debater o tema, o Aluísio Antônio defendeu a importância do júri para a sociedade. “Estamos dentro de um narcoestado, que aprisiona, violenta, mata e escraviza comunidades. O júri é a representação mais essencial da democracia no país. É a única instituição que funciona na sua integralidade”.
Programação da tarde
A programação da tarde teve início com o painel “Quesitos do Júri”, com palestra do juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Orlando Faccini Neto. A mesa foi presidida pelo juiz-presidente do 1º Tribunal do Júri de Belo Horizonte, Ricardo Sávio de Oliveira, e o tema foi debatido pelo promotor de Justiça do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) Rodrigo Monteiro da Silva.
Para o palestrante Orlando Faccini Neto, os quesitos são como um calcanhar de Aquiles no júri. Na avaliação dele, as grandes discussões do Direito Penal estão se ficando no âmbito processual. “O que antes era instrumento para aplicação do Direito agora está sendo usado como ferramenta de não-aplicação. É necessário cumprir o que está na lei”, destacou. Durante a sua fala, ele citou alguns casos, como confundir coautoria com participação, crimes que foram cometidos por um matador mas que também devem ser imputados a líderes de facções, crimes conexos, clemência, entre outros.
O debatedor Rodrigo Monteiro da Silva afirmou que o juiz do júri está sendo refém de nulidades e algumas delas sequer existem. “É preciso ter cautela quando se fala de quesito”, comentou.
O painel “Da imputabilidade do psicopata”, segundo da tarde, foi apresentado pela advogada e professora Michelle Abreu. O tema foi pesquisado durante dois anos pela palestrante e, em 2013, se tornou livro, que já está na 3ª edição revista e ampliada.
Michelle defende que o criminoso psicopata deve responder pelos crimes que cometeu, pois ele tem plena consciência e controle do que faz. “Não é um transtorno mental, mas um transtorno de personalidade, no modo de ser de um indivíduo, que já nasceu assim. O psicopata sabe quais são as normas da sociedade e aprende, desde a infância, como se manifestar. Sabe quais são os momentos para chorar, mostrar arrependimento, mas não são sentimentos sinceros”, esclareceu.
Segundo Michelle, há um conjunto necessário para realizar um diagnóstico, em que é imprescindível a entrevista clínica e o teste do borrão. Esse último, por exemplo, só pode ser realizado por psicólogos e tem que ser presencial. “É preciso tomar cuidado com o laudo”, ressaltou. Ela salientou ainda que, nos tribunais, deve ser questionado quem é o criminoso, como praticou o crime, o que ele fez no momento anterior e posterior. “Essas informações são valiosas”, disse.
O painel teve como debatedora a presidente da Confraria do Júri, promotora de Justiça do Mato Grosso Marcelle Rodrigues da Costa e Faria, e foi presidido pelo promotor de Justiça do MPMG Ângelo Ansanelli Júnior.
Em seguida, o brasileiro Khalil Quinan, que atua como promotor de Justiça nos Estados Unidos, ministrou a palestra “A Experiência de Miami – Atuação conjunta: Polícia e Ministério Público no combate aos crimes dolosos contra a vida”. O painel, que não teve debatedor foi presidido pela promotora de Justiça do MPMG Thaíza Machado.
Quinan contou como é feito o processamento de informações durante as investigações, o papel de promotores, investigadores e policiais, apresentou algumas provas, como mensagens de conversas que estavam em telefones celulares de um co-conspirador de crime, fotos e vídeos que mostram a ação dos bandidos. Ele também comentou as diferenças entre o Tribunal do Júri no Brasil e nos Estados Unidos.
Encerrando a programação do segundo dia do evento, Adriana Lima, médica legista do Instituto Médico Legal André Roquette de Belo Horizonte apresentou o painel “A perícia médico legal e a implementação de novas tecnologias. Ela mostrou quais são as novas tecnologias utilizadas e o que os laudos periciais dos profissionais podem acrescentar atualmente ao Tribunal do Júri.
Adriana citou o exemplo de uma tecnologia desenvolvida no IML, chamada de necropsia virtual, que direciona o legista a realizar um trabalho mais objetivo. Com esse método, antes da necropsia convencional, os corpos são passados em um tomógrafo e é feita uma análise preliminar em que são destacadas as alterações do corpo. Segundo a médica, as imagens que são resultado desse procedimento não trazem apelo emocional porque são reconstruções tomográficas do corpo.
“Essa tecnologia traz clareza e facilidade de entendimento a pessoas leigas que não têm conhecimento médico. Esperamos que os operadores do Direito se sintam à vontade para usar as informações dos nossos laudos no Júri”, comentou.
O painel contou com o promotor de Justiça MPMG e Professor na Dom Helder Escola Superior, Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro. O debatedor foi o promotor de Justiça de São Paulo (2003) e titular do Tribunal do Júri de Guarulhos, Rodrigo Merli Antunes.
Fonte: Ministério Publico MG