À memória de Darcy Ladeiras Dias
Sabrina Carvalho
A flauta dos faunos sibila ante o retorno da menina cálida. Trovadores galícios distribuirão cancioneiros de louvação à mulher que tomando a grosseira constituição da carne fez-se Arte em seu mais apurado estado. Transmutava as barreiras do materialmente possível e ria ao lado de Mefistófeles tanto quanto se imolava junto da inocência de Fausto. Compreendia a infinita humanidade dos Deuses e era deles conselheira quando derramava sobre o papel palavras que acendiam um lirismo furioso capaz de elevar os homens ao vislumbre de sua mais íntima natureza. Na mística de dar aos filhos de terras brasileiras a compreensão dos versos que agitavam a França tornava-se fruto das águas. Pois somente aquela completamente imersa nos eflúvios contornos da Poesia poderia presentear Rimbaud conferindo à seu mais célebre poema a rara tradução de Nau sem Rumo. Nos seus curtos passos havia o peso do mundo. Havia uma força de comoção diante dos sacrificados que poucos serão capazes de mensurar. Afinal o Sacro Ofício de hastear a flâmula incendiária da Arte Darcy conhecia muito bem. Darcy Ladeira Dias, mulher de princípios políticos libertários caminhou desde à juventude ao lado do povo e enfrentou às censuras cotidianas da ditadura vagando grávida pelos porões da casa onde vivia para ler as obras proibidas pela Censura. De constituição física frágil todos que a conheceram sabiam que ela ostentava a grandeza de todas as obras que não só lera mas sim havia se incorporado a cada uma delas. Lamentamos sua partida como a própria Darcy fazia quando chorava a perda de seus queridos declamando baixo quase em suspiros a frase do poeta Camilo Pessança: “Só, incessante, um som de flauta chora” e saudamos sua memória na esperança de que nosso árido planeta Terra possa algum dia novamente conhecer um ser com sua onipotente grandeza artística.
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