Medicina popular, conhecimento e fé
* Roberto Tereziano
Por mais avance a medicina em nossos dias há conhecimentos que populares que vão pouco a pouco desaparecendo, mas que fizeram parte da cultura e do socorro curativo de muitas pessoas.
No tempo dos quintais de terra era comum que as casas tivessem pelo menos, o que poderia ser chamado de farmácia doméstica. Lá se encontrava uns cem números de plantas que desde os tempos da Vovó, eram usados nas horas de mal estar.
Havia também as benzedeiras. Quase todas as mães tinham uma benzedeira de confiança, especialmente quando o assunto era incomodo em criança. Elas aplicavam suas rezas antigas, seguidas de determinados rituais e a criança voltava bem pra casa.
Hoje a ciência reconhece que a fé não é apenas algo místico ou dogmático, ela é energia e age em determinado ponto do cérebro, fazendo com que ele produza ordens ou substancias curativas no organismo. Também se sabe agora que a gordura da canja de galinha que a vovó usava na cura dos resfriados realmente tem propriedades medicamentosas.
Muitos desses remédios caseiros ou alternativos acabaram por merecer melhor estudo da medicina oficial, quando se constatou na grande maioria, propriedades auxiliares à determinados tratamentos dos dias de hoje. Não nos esqueçamos que no dia-dia rural, quando se tinha um ferimento com possibilidade de evoluir para uma infecção, se recorria a um tipo de fungo, um bolor presente em certas plantas e em especial nos pés de café.
E foi de uma espécie de fungo que o Dr. Fleming descobriu e isolou o histórico antibiótico chamado Penicilina, que é um divisor na história da medicina. As pessoas mais idosas sempre recorrem a uma planta com poderes curativos. Lembro-me que quando criança, por gostar de medicina, sempre tinha na minha modesta biblioteca, alguns livros relacionados ao uso de plantas. Um deles chama-se “Beba Para Curar-te” e o outro “As Plantas Curam.” Ambos traziam centenas de indicações para os mais diversos incômodos.
Havia também pessoas com intrigantes conhecimentos populares miraculosos. As pessoas que moraram nas imediações entre o alto da Rua Assis Figueiredo e o Bairro São José nos anos 70, vão se lembrar de um senhor Negro, bastante idoso, chamado Sr. Margarido. Bastava que qualquer pessoa desejasse se livrar de um gato que estava incomodando e ,lá estava ele para a infelicidade do felino. Com a carne do bichano ele preparava um prato bastante apreciado pela vizinhança, e com a banha, ou gordura do gato ele preparava um remédio para as pessoas que sofriam de asma. Tal remédio era muito solicitado.
No antigo Bar Ao Ponto, trabalhava no café a saudosa Dita do Bar ao Ponto. Além do delicioso café por ela preparado, ela tinha também várias alternativas medicamentosas através de plantas que ela cultivava. Vi por várias vezes, médicos da cidade recorrer aos chazinhos da Dita.
Pelas Bandas do Bairro Vai e Volta, (Rua Barão do Campo Místico) morava o Seo Valter, pintor. Ele era uma espécie de Dr. Sucú Sarara, medico alemão que até se tornou hoje, nome de Rua no Rio de Janeiro, dado ao sucesso que obtinha nos tratamentos de Hemorroidas. Porem, Seo Valter usava uma determinada planta em infusão e o sucesso era tão garantido que depois do tratamento sempre o paciente impaciente voltava feliz para agradecer e trazer um presente para pagar.
Havia também pessoas que aplicavam tratamentos potencializados pela fé. As plantas eram auxiliares. No quarto quarteirão da Rua São Paulo, entre Rua Santa Catariana e Rua Correia Netto, Morava Sr. Antônio Camilo, também tratado como Dr. Camilo, um mulato de olhos claros, sempre muito calmo e atencioso com as pessoas. Acredito que ele fabricasse e vendesse carvão para churrasco. Antônio Camilo estava diariamente sentado em frente de sua casa até que um paciente chegasse a sua procura.
Era uma espécie de clinico geral popular, ele sempre resolvia a enfermidade, porem a especialidade dele era com a estrutura óssea. Em tal assunto ele desafiava a medicina oficial. Há relatos que muitos médicos da cidade, quando não conseguiam solucionar problemas, específicos, especialmente no aparelho locomotor, mandavam seus pacientes para o Dr. Camilo.
Algum tempo depois, “milagrosamente” o paciente que chegou travado, (ou entrevado como diziam) em uma maca deixava o “consultório” andando. Tudo isto nada tem com curandeirismo. Refiro-me a pessoas corretas e honestas que apenas queriam servira quem padecia. A palavra dinheiro não estava no projeto.
Nos dias de hoje, frequento a comunidade indígena Xucuru Cariri, de Caldas-mg. Lá temos uma, quase centenária, índia chamada Vó Flora. (tem flora até no nome) Não sei o nome indígena dela.
Vó Flóra, seria uma espécie de pajé sem ritual. Seu quintal tem dezenas de plantas que ela cultiva com cuidado. Ela conhece cada uma e sabe a sua utilidade no tratamento de muitas doenças.
Pena que muitos de tais conhecimentos populares foram, na maioria das vezes, perseguidos e não melhor estudados ou revelados. No caso da nossa indígena, ela acaba de ganhar um livros através da doutora em pedagogia Beatriz……….. E bem a pouco tempo um ornitólogo e ex-diretor do Jardim Botânico de Poços de Caldas comentou estar interessado em fazer uma pesquisa com pessoas antigas sobre o uso de plantas medicinais.
Felizmente hoje, determinados remédios naturais vindos de plantas já podem ser encontrados até nas farmácias do SUS, mas muito se perdeu do que os antigos sabiam.