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A Resistência das Bancas

Com o avanço da tecnologia, as bancas de jornais estão ficando raras a cada dia – foto Roni Bispo

Hoje, 30 de janeiro,  dia em que se celebra o Dia da Saudade, a advogada Cacá D´Arcardia nos remete ao saudosismo tempo em que as bancas de jornais eram as fontes de informação, entretenimento e cultura. O artigo “ A Resistência das Bancas” nos proporciona a uma viagem no tempo.

A compreensão da cultura e do patrimônio frequentemente requer um mergulho na História, especialmente em períodos nos quais indivíduos alheios a esses conceitos assumem posições de decisão.

A trajetória da imprensa no Brasil inicia-se no começo do século XIX, quando a transferência da Corte portuguesa para o país evidenciou a necessidade de um veículo de comunicação oficial. Em 1808, foi estabelecida a Impressão Régia, responsável pela publicação da “Gazeta do Rio de Janeiro”, o primeiro jornal impresso em território nacional.

Diferentemente do “Correio Braziliense”, fundado no mesmo ano por Hipólito da Costa e impresso em Londres, a “Gazeta” era produzida no Brasil e atendia aos interesses da monarquia.

Ao longo do século XIX, o comércio de jornais e periódicos consolidou-se, acompanhando o crescimento urbano do  país.

Acredita-se que a primeira banca de jornal tenha surgido no Rio de Janeiro, idealizada por um imigrante italiano chamado Carmine Labanca, cujo sobrenome teria originado o termo “banca”. Inicialmente, essas estruturas eram compostas por tábuas e caixotes improvisados, evoluindo posteriormente para barracas de madeira e, mais tarde, para as estruturas metálicas que conhecemos hoje.

Em São Paulo, o pioneirismo das bancas de jornal é atribuído ao imigrante português Salvador Neves, responsável pela tradicional Banca Estadão, que operou por mais de 50 anos, tornando-se um ponto de referência na cidade. Esses locais não eram apenas pontos de venda de impressos, mas verdadeiros centros de encontro e disseminação de informações.

Embora a escassez de material dificulte uma narrativa precisa sobre as bancas de jornal em Poços de Caldas, é inegável que, assim como em outras cidades, elas sempre integraram o cotidiano urbano, desempenhando um papel fundamental na vida dos cidadãos e no patrimônio histórico material.

As bancas de jornal transcendem a função de meros pontos comerciais. São espaços de sociabilidade, onde leitores se encontram, formam amizades, compartilham ideias e cultivam o hábito da leitura. Para muitas crianças, as bancas representam o primeiro contato com gibis, essenciais para o processo de alfabetização e estímulo à imaginação.

Além disso, oferecem acesso a livros, artigos de interesse geral e servem como refúgio para aqueles que ainda valorizam o jornalismo impresso.

No início dos anos 2000, com a popularização da internet, os jornais impressos começaram a perder força, impactando diretamente a sobrevivência das bancas. Para se manterem ativas, muitas passaram a diversificar seus produtos, vendendo desde doces e brinquedos até itens eletrônicos.

Com a pandemia de 2020, essa necessidade de adaptação intensificou-se ainda mais, forçando os jornaleiros a reinventar seus negócios para enfrentar a crise econômica.

Atualmente, os proprietários de bancas afirmam que já não é viável depender exclusivamente da venda de jornais e revistas, sendo necessário complementar a renda com outros produtos. No entanto, a importância histórica e cultural das bancas de jornal permanece inquestionável.

Elas continuam a ser símbolos de resistência em um cenário de mudanças tecnológicas e sociais, representando não apenas um ponto comercial, mas um verdadeiro patrimônio cultural das cidades.

Além dos valores históricos, as bancas de jornais possuem um valor educacional imensurável que muitos ignoram, por não fazer parte de sua realidade econômica.

A comercialização de livros com preços acessíveis, gibis e periódicos científicos nutre uma parcela significativa da população, tanto pelo valor quanto pela facilidade de acesso.

É inegável que os gibis facilitam a alfabetização de milhares de crianças pelo país. Tanto é verdade que compõem listas de materiais de escolas para reforço pedagógico. A professora Liliani Aparecida da Rosa, do Colégio Positivo, afirma: “A leitura contribui com habilidades socioemocionais que o ser humano precisa aprimorar ao longo da vida, como empatia, senso crítico e noção de pertencimento a partir da identificação com os personagens da história. O apelo visual, a dinâmica ágil da narrativa em quadrinhos e o humor presente no enredo fazem com que o momento da leitura seja prazeroso e descontraído, despertando ainda mais interesse pelos textos”.

As bancas de jornais e revistas contribuem para o acesso à diversificação de literatura, pois disponibilizam, ao alcance da população, outros gêneros narrativos que apresentam,  gradativamente, desafios de leitura.

As bancas contribuem para o desenvolvimento do hábito da leitura, de acordo com pesquisas de mestrado.

E só não reconhece isso quem nega o acesso à educação. Em Poços de Caldas, as bancas de jornais são padronizadas desde 2003, não rompendo com o processo arquitetônico da cidade, ao contrário de fachadas de lojas que escondem a história dos imóveis, poluindo visualmente a rua principal.

Romper com a cultura das bancas de jornais é impedir o acesso a produtos literários com valores acessíveis, suprimindo espaços de convivência. Mais que isso, é privar dezenas de  famílias que se sustentam há décadas deste setor. O impacto é educacional, social e econômico.

Espera-se que apreço pela história, pelas pessoas, pelas famílias e pelo diálogo derrote a aversão à coletividade à história. – texto Caca D´Arcardia

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