O jornalismo em tempos de desinfodemia
*Roberto Tereziano
Havia um tempo em que os jornais, especialmente os impressos, eram sinônimos de verdade.
As pessoas depositavam plena confiança nas informações e afirmavam: “É verdade, eu li em tal jornal”.
Entretanto, tal convicção não pode ser creditada como absoluta. Mesmo em tempos passados já existiam jornais e jornalistas sérios, como também os vendáveis. Talvez isto explique uma nota publicada muito tempo atrás, no jornal Diário de Poços de Caldas. A data do mês de fevereiro registrava “O dia da boa imprensa.” Logo, se existia até uma data em especial, conclui-se que existia também o contrário.
Com o aparecimento das redes sociais, se por um lado a informação deixou de ser algo de via única, entrojetado ou impingido nas cabeças das pessoas tudo como verdade, e permitiu que milhares de pessoas consumidoras de informação passassem também a produzi-las, ou contestá-las, também multiplicou a “desinfodemia” com notícias falsas que entraram em nosso dia-dia cheio de estrangeirismos, como se fala em inglês, Fakes News. (falsa- noticia).
Diga-se de passagem, não é apenas em utilizar termos estrangeiros que o jornalismo estadunidense, influencia a pratica de produzir notícias no Brasil e também em muitos outros países. O manual por eles ditado traz uma série de normas éticas que mais se parecem uma “Bíblia” do jornalismo, porém, que na pratica não é seguida nem por quem a inspirou. Num capitulo tal, versículo “X” o manual do jornalismo prega a imparcialidade, ouvir os dois lados da notícia, checar a informação em fontes confiáveis, etc. Na prática tais itens nem sempre são aplicados, e se o forem, não quer dizer que o fato revelado seja plenamente verdadeiro. Por mais honesto que queira ser o profissional com a informação, ele não pode se esquecer de que é também produto do meio de uma sociedade formada ou deformada por interesses outros, e que nem sempre a sua verdade é a verdade absoluta. Já, quando se refere a maus profissionais, a deformação intencional se potencializa. A propaganda, por exemplo, pode ser usada para o bem ou para o mal. Na segunda opção ela tem a força de construir mitos levando massas populacionais á crenças ou atos insanos.
Para muitos na Itália, Mussolini era o líder que traria a “Paz”. Ele conseguiria acabar com o desemprego e a insegurança. O slogan criado por sua assessoria através da imprensa induzia a raciocínio tipo: “Acredita! Obedece! Luta!” “Quem tem aço tem pão!”. A massa acreditou no “Líder infalível” criado pela propaganda, e foi ele quem aboliu a autonomia das cidades, declarou ilegais todos os partidos, exceto o seu.
Um estudo realizado pelo professor Alcir Lenharo, da UNICAMP conclui que a arma mais poderosa de Hitler foi o uso da força da propaganda, através de jornais, rádio e cinema, que o líder alemão chamava de propaganda em movimento. O professor mostra em seu livro, como o cinema (patrocinado) pelo governo alemão, se tornou uma peça vital em todo o mecanismo da propaganda nazista.
São do próprio Hitler as conclusões de que a propaganda tem que ser popular, dirigida às massas, desenvolvida de modo a levar em conta um nível de compreensão pelos mais baixos, e restringir-se a pouquíssimos pontos, repetidos incessantemente. O essencial é que ela atinja o coração das massas. Disse ele: ”Tudo interessa no jogo da propaganda: Mentiras, e calúnia. Calunia para mentir, que seja grande a mentira, pois assim sendo, nem passará pela cabeça das pessoas, ser possível arquitetar tão profunda falsificação da verdade”. Calcula-se que foram produzidos 1,350 longas metragens “patrocinados,” nos doze anos que durou o domínio nazista. Comédias, musicais, operetas, etc. Todas com sutis exaltações aos valores do regime foram entregues ao publico.
Tal método fez escola pelo mundo. Só para não ir muito longe, em 1965, um departamento criado nos Estados Unidos, O USIS (United States information Service) desprendeu vários milhões de dólares para distribuir pelo mundo 14.500.000 livros cujo texto era revisado e finalizado pelo próprio departamento que também pagava os autores, sem que o nome da agência fosse mencionado. “Controlamos (secretamente) o livro desde sua concepção até às ultimas correções do manuscrito.”
Tais livros tinham como objetivo, atacar, ideologicamente, nações e regimes contrários ao Tio Sam. E promover o “American whay of lifes”.
James Reston escreveu certa vez no New York Times: “Os jornalistas, os redatores e redatores-chefes de alguns jornais, normalmente, são pessoas não muito ricas. Alguns deles são vulneráveis à corrupção financeira e a CIA não hesitou em utilizá-lo sempre que isso foi possível”. Também, o cinema foi fortemente utilizado pelos americanos para entrojetar no mundo como exemplo, “O modo americano de viver”.(e também a ideologia e métodos imperialista ou capitalista.) Se tais distorções ocorrem nos bastidores de países tidos como democrático, o que não se suspeitar dos regimes totalitários?
Na historia da comunicação do chamado terceiro mundo a desinfodemia há muito está presente. Mitos, heróis e bandidos criados diuturnamente se perduram por dezenas ou centenas de anos e quando desmascarados aquela pandemia já se foi. Não se repara mais os prejuízos causados.
Ainda há poucos dias, o jornal americano Washington Post publicou em seu “Detentor de mentiras” que durante os quatro anos de governo, Donald Trump aplicou nada menos que 35 mil mentiras. Realmente o publico consumidor de informação tem que estar diariamente vacinando-se para se imunizar de falsidades ideológicas camufladas nas entrelinhas de milhares de notícias que correm o mundo em apenas alguns segundos, conhecer suas fontes e tirar suas próprias conclusões sobre tudo que lê, ouve ou assiste, pois nem tudo é realmente o que parece.
Embora que a comemoração do dia da boa imprensa está esquecida, pode se notar que, de há muito tempo ele seria bem vindo.