TREM ( VI ) Ludgero Borges
Por fim o ensurdecedor comboio de dezenas de toneladas completava a entrada na Estação num alarido de ferro se arrastando sobre ferro, ranger de freios, assopros de vapor quente e de ar comprimido e o crescente murmúrio das gentes esperantes e chegantes entremeados de uma espécie de viva “ao Trem de ferro” tudoôo ou nadaaa” ! ! ! Aqui precisamos anotar algo que diferencia outras chegadas de Trens n’outros lugares A plataforma interna de espera e serviços nestes momentos fica apinhada de gente, do meio para o final dela onde vai estacionar a locomotiva e os carros de passageiros. Do meio para o início da plataforma – por onde vai entrar o Trem -, fica mais raleado e o notável é que enfileirados no sentido ombro a ombro, em pé com a frente para o lado dos trilhos e distanciados um metro um dos outros, ficam os despachantes -carroceiros – a espera dos vagões ainda em movimento, mas diminuindo a velocidade até parar. É um espetáculo de causar inveja a instrutores de ordem unida, ou professoras de balé ; tão logo os carros de passageiros com suas janelas abertas e ainda com movimento, em diminuição, alcançam a plataforma, os despachantes grudam na sua lateral, um em cada janela, onde engancham o braço direito na ventana, sempre correndo igualmente com o carro, enquanto com o braço esquerdo gesticulando, e com os olhos fincados nos de passageiros, oferecem seus serviços para desembaraçar bagagem na parada final e conduzi-la ao seu destino. Um espetáculo ! Ninguém se atropela ou invade áreas de colegas apesar da carreira digna de uma São Silvestre disciplinada. A maioria dos despachantes pode conseguir até dois ou três fregueses, pois nos seus bonés de licenciados pela CM, traz um visível numero o que dá uma segurança aos passageiros. É como se o despachante tivesse auxiliar e enquanto se comprometia com um cliente, o ajudante iria reunindo pertences dos já aderidos. Não eram todos os carroceiros que corriam as janelas, por condições físicas ou outras. 0s que simplesmente assistiam , prestavam ou não serviços aos colega ajudando-os a organizar e carregar as bagagens, fazer anotações dos endereços nos quais se comprometiam entregá-las em menos de uma hora, isto se o freguês não tomasse ali mesmo no pátio, uma locomoção. Taxistas -chamados de chofer.-, gratificavam os despachantes pelos serviços. O mesmo acontecia com os hoteleiros.
Este Trem Expresso compunha-se de um carro de passageiros classificado de segunda classe , tinha bancos para 3 pessoas, de madeira, com certo conforto em quase toda sua extensão, com um corredor no meio do vagão, Na ponta do carro havia um sanitário feminino e um masculino , uma pia, toalha, sabonete líquido ou em barra, espelho e um cabide. A seguir, outro vagão de passageiros, de primeira classe, na mesma dimensão externa , mas com algum requinte melhorado como os sanitários, os assentos e espaldar eram estofados, revestidos de palhinha própria ou couro tendo de quebra, um encosto para a cabeça, revestidos de capa de pano branco ou bege, que eram trocadas em cada viagem Ah! Tinha ainda quase sempre, um guarda ou Train-moço para pajear os passageiros, servindo de vez ou outra um cafezinho ou copinho de chá e revistas velhas. Vocês viram só ? Até na composição tinha mordomias. O primeiro carro da composição era engatado na máquina e era destinado a uma repartição para encomendas ou cargas urgente, correio, correspondência restrita ás autoridades, uma cabine para os 1º e 2° Guarda-Trem, um Mestre ´de Linha e possivelmente uma autoridade civil ou milica. Neste vagão se engatava o de 2ª classe e por último estava ligado o carro de primeira. Explica-se; Nossas estradas de ferro eram do tipo nostálgico Maria Fumaça com fornalha, caixa de fumo, serpentinas de vapor, grelhas e tudo o mais que se achava no direito de possuir, não faltando uma chaminé que expelia o tempo todo, sobras de fumaça engrossadas com carvõezinhos acesos mais conhecidos por brasinhas que se sentiam vivas e latejantes por um minuto quando em liberdade e consequentemente no direito de continuar azucrinando o sêr mortal até 60 segundos tempo suficiente para uma cobertura do vagão de carga, sobrando uma pequena porção para o carro de passageiros de 2ª classe. Esporadicamente umas fagulhas persistentes alcançavam o carro de primeira classe por estar mais longe da fonte vulcânica. Certo ? A propósito da Maria Fumaça conta-se a seguinte anedota:
2 ,gajos embarcados ano passado contemplavam a paisagem pela janela do trem quando um deles disse – Ops ! Entrou me uma fagulha no olho . – Qual fagulha qual nada homain. Estamos num train elétrico – Ah é mesmo ? Então fui atingido por um quilovate ..
Parado o trem, era só festa no lugar; pessoas se abraçando, beijos e abraços e um vozerio alegre, rizadas e gente cuidando de seus pertences todos na direção da saída do prédio. Lá perto da locomotiva abria-se o vagão de bagagem para livrar malas cabines de passageiros e outras, em algum caso animais de estimação que não vieram nos colos dos passageiros de 1ª por concessão especial , encomendas urgentes, peixes em caixas com sal grosso -estes eram encaminhados imediatamente para o Pálace Hotel, onde seria preparado e servido ainda no jantar – , amarrados de jornais e revistas e junto deles, o programa e publicidade do que estava acontecendo na cidade e precisava ser distribuído nos hotéis, bares, restaurantes, casas de espetáculos e ao povo em geral. Jornais do dia, de S.Paulo e Rio de Janeiro . Estes não eram prioritários como o programa cinematográfico e circense.