Colaboraboradores convidados

TREM (VII ) LUDGERO BORGES

trem

Parado o trem, era só festa no lugar;   pessoas se abraçando,   beijos e abraços e um vozerio alegre,  rizadas e gente cuidando de seus pertences todos na direção da saída do prédio.  Lá perto da locomotiva abria-se o vagão de bagagem para livrar malas cabines de passageiros e outras, em algum caso animais de estimação que não vieram nos colos dos passageiros de 1ª por concessão especial ,    encomendas urgentes,  peixes em caixas com sal grosso  -estes eram encaminhados imediatamente para o Pálace Hotel, onde seria preparado e  servido ainda no jantar –  ,  amarrados de jornais   e revistas e junto  deles, o programa  e  publicidade   do    que estava acontecendo na cidade e precisava ser distribuído nos hotéis,  bares,  restaurantes,  casas de espetáculos e ao povo em geral.  Jornais do dia,  de S.Paulo e Rio de Janeiro .  Estes não eram prioritários como o programa cinematográfico      e circense.       Tao logo os carros eram abertos ,   cada pessoa atacava ligeiro seu setor de trabalho,  distribuindo funções;  alguns empunhavam uns 30 jornais  numa improvisada bolsa de papelão a tira colo e saiam esguelando     -Oóólha a Folhaaa,     -óóólha o Diario  de São Pauuulooô,   – olha o Correio Paulistano,    Jornal  do Brasil,   -óóólhe     a Folha da  Manhããã     e  a  Folha da Noite,   -olhe a Noite Ilustrada,   – tenho o Jornal do Comércio e o Estado de São Paulooo,             preferindo gritar nas portas de hotéis,  de clubes            e bares.   Outros distribuíam programas das atividades  em Poços,  Havia sempre uns dois ou três moleques mais chegados aos afazeres normais da Estação.      Os freios modernos de vagões e máquinas eram do tipo  a vácuo tendo em cada  vagão  uma geringonça que se ligava  em toda a composição através de tubulação semi flexível até á um comando ao alcance do maquinista,  de formas que acionados,  todas as rodas da composição seriam brecadas,  pois a inércia ativa do comboio  não  deteria o Trem em poucos metros de arrastão se contasse só com o breque mecânico.    0s eixos e rodas, poderiam    permanecer presos,  porque  dentro dos pistões um pouco de ar comprimido ou gás,   presos,  continuariam apertando as sapatas de atrito,  mas em cada conjunto de freios  existe uma alça de arame que se liga na beirada externa dos carros    que   pode ser acionada liberando as rodas.   E  Isto tinha de ser feito  sempre após cada estacionamento com curta   distancia como agora.   Enquanto havia o movimento na plataforma,  nós percorríamos os carros,  e descomprimia os pistões dos freios,  puxando a  tal  alça e  desengatávamos as mangueiras de ar comprimido em seguida dávamos bela checada nos carros na  esperança de encontrar algum valor  como moedas,  broches,  medalhas,  cigarros,  documentos ,  canivetes, óculos e  outros bichos.  No decorrer final da tarde,  o  Sr. Maneco manobrador e o foguista manejavam os caros nas diversas linhas do pátio, montava-os no sentido de partida, já colocados na linha-mor e levavam a locomotiva para o viradouro  atrás do cemitério e a colocavam  na Casa de Máquinas nas mãos do Limpador       Essa labuta da tarde parava invariavelmente as l8,30 h.     quando chegava o Guarda Noturno  que permanecia até as 6,oo h  do dia seguinte. Na verdade os funcionários em comum acordo faziam um rodízio e um deles faltava  ao serviço   depois do almoço, para vir dar um trato no expresso entre 6,30 h as e 20,00h com muita água,  sabões,  escovas,  buchas,  panos,  desinfetantes,  espanador,   rodo,  vassouras,  palha de aço e que tais.   Vez por outra, fazia esse mise-em-plise- depois de  levar a namorada no cinema ou na seção de namoro,  quando ela própria não vinha colaborar com aquele capricho comum das prendas caseiras.  Não era incomum a família inteira de um funcionário vir dar aquele capricho no  P – 1,  que lá nos fundos de suas consciências consideram seus lares  como suas hospedarias,  tal como  os árabes,  consideram  as  visitas,  dignas   de respeito e hospitalidade.    Queriam que os  hospedes  voltassem sempre.      Desde os preparativos para receber o Trem das Cinco,  o movimento interno na Estação na verdade iria até o começo da noite se incluirmos o asseio geral nos vagões de passageiros.   As manobras do pátio de trilhos continuavam  até uma hora depois do Trem estar livre e desimpedido  porque precisava-se manusear o comboio de maneira a estar pronto para reiniciar viagem no dia seguinte,  manobrar vagões noutras linhas e que só poderia ser feito com a locomotiva foguista e manobrador,   abastecer de água os carros da composição antes de alinha-los na reta de partida,  manobrar os vagões de carga que estavam no pátio,   virar  a locomotiva ao contrario de quando  chegou,  abastece-la de lenha,  carvão mineral ,   água  e só então conduzi-la para a  Casa de Máquinas estacionando-a em cima de uma valeta de concreto armado para trabalho do  limpador      que parecia sempre aguardar  de bom humor.   Começava este a apagar o restante do fogo da fornalha e esfriar tudo com generoso jato de água e então cantarolando coisas até imaginárias e  mão na graxa  visto que de agora em diante,  até o final,  era só limpeza,  raspagem de barro ressequido,  lixamento,  reapertarem  de parafusos e porcas,  desobstrução de peças e consequente lubrificação;   linguajar curioso surgem nas profissões né ?  quando  dizem lubrificar, referem a adição de óleos de diversas texturas  e quando   engraxar,  se referem introduzir  pasta expeça,  mais grossa que  visgo .   Agora estando todos os mancais,  rolamentos,  cumanceiras,   pinos e  eixos  azeitadinhos   da silva,  o limpador faz um  asseio daqueles pra ninguém  botar defeito como de sua cliente  fosse desfilar num concurso de locomotivas bonitas e elegantes.    Terminando  este básico,   não deixando um nadinha de sujo em qualquer  parte,  ele partia para a  Aplicalustração  incluindo Kaool    -um líquido grosso-  especial para bibelôs e peças de estimação, nas partes metálica douradas ou prateadas   Agora  são 5 ou 6 horas da matina.  Forra e fundo da fornalha com lenha,  ateia fogo e vai tomar  o seu banho quente com muito sabão de pedra  e uma pasta arenosa,  cantando no capricho como se fora um Bing Crosby,  All Jonson, ou Benaminio  Gigli..      As 7 horas chega  com cara de sono o foguista que aplica a  clássica pergunta;   -Dia.  Alguma novidade ?    tudo bem ?   e a nossa Maria Fumaça ?     e, recebe as respostas também clássicas.  0  foguista  arregaça as mangas da sua camisa  kaki e escolhe paus de lenha a seu gosto e abastece a fornalha da sua maneira peculiar que já fora acesa pelo limpador.  Testa todos os pontos vitais de praxe e chega a dar um apitinho discreto como a dizer  oquei  e coloca em movimento aquele instrumento que descansara a noite toda e acabava de sair de seu toalete,  ainda fresquinho e perfumado,  pronto para atacar  outra  jornada de mais umas 12 horas no cumprimento de seu dever  de     transportar vidas,  valores, prazer e até sonhos,      contribuindo  com o ganha pão  direto  e  indireto do ser humano.       A máquina  deslizava  devagarinho como que reservando suas energias para transpor os vales, morros,  planícies desde Poços de Caldas  até pelo menos Aguas da Prata,  ainda dentro a cratera de um vulcão extinto a mais de 12 mil anos cuja  boca   ( cratera )  consideramos que seja  no sitio  Campo do Meio aqui na região de Caldas .     Esta  1ª  marcha  no  pátio   da CM,   aforando  a economia de energia,  pode-se  também ser interpretada como homenagem  aos primeiros passos de um bebê , quando da partida da composição  que inaugurou o primeiro trecho da Estrada de Ferro C M  que partindo de Campinas , chegou  a Jaguary ,    -hoje Jaguariuna-  em    03/05/1875    depois de percorrer 34 kilômetros  de emoção e confiança no futuro.     

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