A vida e arte de Bruno Filizberti 49 anos depois
Os caminhos da vida escolhidos pela arte são verdadeiramente enigmáticos. Poucos são os olhos clínicos capazes de ver além da aparência, o que pode existir de sensibilidade e delicadeza em uma pessoa. Seria como se nós, pobres mortais, olhássemos para um bloco de pedra com olhos de um Fídias ou, Antônio Francisco Lisboa, também apelidado de Aleijadinho.
Veríamos as mais belas imagens, os corpos que Fídias talhara. Os profetas de Congonhas do Campo, ou num emaranhado de letras desconexas, Camões ou Homero veriam versos eternos.
Não seria diferente no mundo das telas e tintas. Talvez, duvidássemos que um Miguelangelo, um Rafaello, ou um Leonardo Da Vince fossem as genialidades que a humanidade conheceu.
Aliás, durante a renascença um cliente a procura de um dos grandes pintores chega a um modestíssimo casebre e se expressa:
Como pode de um homem tão rude nascer tão belos quadros?
A duvida bem poderia ser transferida para nosso pintor maior, Bruno Filizberti, tímido, quieto e até tido como antissocial.
Porem, as palavras que ele não emitida e os sorrisos que ele não expressava vibravam nos seus pinceis e nas cores de seus quadros. Em tudo revelavam o outro Bruno.
Poucas foram as pessoas que viram num italianinho pobre, recém-chegado da cidade de Mococa, que a pouco perdera sua mãe que morrera durante a pandemia da gripe espanhola, fora, praticamente, adotado por outra família já que o pai, por problemas pessoais não tinha como mantê-lo.
Eis ai o embrião do menino Bruno, nascido em 11 de junho de 1912. Enquanto as demais crianças corriam, pulavam e suas brincadeiras infantis, ele, com pedaços de carvão, sobra dos fogões de lenha, arriscava seus primeiros desenhos pelas calçadas e paredes das imediações de onde morava.
Foram tais desenhos, feitos, vezes por outra, em papéis de embrulho, que chamaram atenção de algumas pessoas que acabaram por encaminhar o menino para o professor Ângelo Guazelli, que foi a base para a história artística do garoto.
A situação de pobreza e necessidades financeiras, aparentemente, conduziam o jovem Bruno para outros caminhos. Trabalhara em várias outras áreas, algumas das quais, pareciam nada relacionadas com artes, mas, todas elas deixaram nele, algum capital cultural, como diria o pensador Valter Benjamin, que serviram no lapidar do futuro artista.
Bruno, embora por caminhos diversos, tinha um objetivo e nunca o perdera:
Queria ser pintor. Nada mais importava. A falta de trabalho o levou de volta a sua terra natal. Em Mococa, foi sapateiro, ajudante de marmorista, ajudante de carpinteiro. De cada atividade ele aguçou a sua percepção para o desenvolver artístico, especialmente, o lidar com couro, madeira e pedras, mas acima de tudo o ensinara a ver o belo. A dureza do mármore o conduzira a leveza das tintas e cores.
Ele observava em cada objeto, o volume, as cores, a luz. Mais tarde, faria suas próprias molduras. Criava suas ferramentas e tintas. Um artista completo.
Mesmo trabalhando em atividades rudes e pesadas ele chega a Escola de artes de São Paulo e a cada passo se revela para o mundo das tintas e telas. Anos depois é diplomando em belas artes, mas seu génio perfeccionista ainda queria mais. Bruno não se considera pronto só porque tem um respeitado diploma. Logo que deixa a escola de artes procura em Campinas o professor Amadeo Scavone e numa espécie de pós-graduação em artes foram mais dez anos de estudos, pesquisas e troca. Um Leonardo na oficina de Verlóquio.
Só depois de toda essa trajetória é que Bruno se julga pronto para ser chamado de Pintor Bruno Filizberti.
Começa então a trajetória já bem conhecida e a sequencia de prêmios e medalhas em salões renomados. E foram dezenas de prêmios.
A pintura em Poços de Caldas passa a ter uma marca limítrofe, antes e depois dele. Não havia uma só casa de bom gosto na cidade que não se orgulhasse de ostentar uma tala de Bruno Filizberti e não foram só telas, caricaturas, ilustrações de jornais, capas de livros e até fotografias. Um artista completo sem perder a modéstia. Uns poucos e privilegiados alunos, pois ele não se considerava professor. Quando o conheci, eu adolescente, ele já era o senhor artista Bruno Filizberti, com dezenas de grandes premiações mas com a humildade de dizer: Não sou professor, Não fui educado para ensinar.
Uns poucos, mas, grandes amigos os quais conseguiram romper seu escudo de timidez.
Uma vida inteiramente dedicada à arte da beleza revelada pelos lápis e pincéis.
Filizberti registrou em suas telas casebres, festas populares, pessoas simples, fundos de mercado, enfim, algumas décadas da vida de Poços de Caldas foram documentadas através de seus pinceis. Tanto tempo depois de sua morte ainda é possível se surpreender com as descobertas de importantes quadros como, por exemplo, o belo registro do início da produção de cristais, tipo murano, em Poços de Caldas por Aldo Bonora. Encontrei por acaso a bela obra na sala do mestre vidreiro veneziano, pouco depois de seu falecimento.
Reconhecido e respeitado pela grande obra, inesperadamente, Bruno Filizberti se apresenta enfermo em 1979, vindo a falecer um mês antes de completar 67 anos. Com Leonardo da Vince não fora diferente, morrera aos 67 anos deixando obra vastíssima.
Passados 39 anos de sua morte, ele e sua obra continuam sendo respeitados e reverenciados e, finalmente, um mecenas colecionador, não só reuniu centenas dos seus quadros e até alguns objetos pessoais, e está patrocinando breve publicação impressa da trajetória de Bruno Filizberti com a intenção de que a vida e obra do nosso artista maior, ganhem as grandes galerias e pinacotecas para que o mundo das artes além das fronteiras regionais tenha mais esse importante nome na historia da arte brasileira. Outra fase a ser preenchida será um amplo estudo da obra reunida e qurm sabe, uma nova publicação com os principais quadros de Bruno que estaria no dia 12 do mês vindouto com 106 anos. RT