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Fratelle Del Core!

*Roberto Tereziano

Fausto Maretti foi um dos históricos enfermeiros de Poços de Caldas. Extremamente profissional e dedicado às pessoas, com muita sensibilidade e respeito que toda profissão merece e as ligadas à saúde muito mais, Fausto Maretti era disputadíssimo pelos melhores médicos de Poços de Caldas.

Depois de dezenas de anos dedicados a profissão e já aposentado, ele passava grande parte das manhãs sentado em frente a sua casa onde conversava com os passantes, brincava com as crianças e contava seus casos e anedotas. Eu tinha lembranças de encontra-lo trabalhando com Dr. José Ayres de Paiva, mas foi ali na porta de sua casa que o  conheci de fato.

A Rua Rio Grande do Sul era meu caminho para a emissora e também para minha casa. Então passava ali por dezenas de vezes durante o dia, começamos a nos cumprimentar, depois trovávamos algumas palavras diárias e nos tornamos amigos.

A medida que a idade dele foi avançando sua área de circulação foi sendo reduzida. Chegou mesmo a ser apenas o quarteirão em que morava, sempre apoiado por uma bengala, passava pelos pontos comerciais e brincava com todos. De vez em quando entravamos numa padaria que existe nas imediações para um cafezinho e um bom papo.

 Chegou um tempo em que a bengala não garantia mais sua segurança, Teve algumas quedas e pequenos ferimentos. Algumas vezes cheguei a auxiliá-lo. Não demorou para que um andador fosse a melhor solução.

Diariamente, bastava que eu apontasse a dezenas de metros para que ele começasse sua encenação. Com a mão no rosto e os dedos entre abertos ele fazia de conta que não estava vendo que eu  me aproximava. Depois estendia  a mão e dizia: “Fratelli del core” venha cá.

Tomava minhas mãos, conferia se minhas unhas estavam cortadas e higienizadas adequadamente. Coisas de enfermeiros cuidadosos com a possibilidade de infecção. Depois contava seus casos. Descendente de italianos, ele era apaixonado pela Itália, teve  a possibilidade de viajar para aquele país e várias vezes me convidava a entrar  e mostrava com orgulho o corredor da casa com muitas fotos de viagem ou mesmo álbuns  com dezenas de fotografias. Ricordi di Itália. Os encontros diários eram uma rotina obrigatória.

Certa vez  no começo do anoitecer o encontro desesperado na porta da casa com seu andador, pedindo socorro. Sua esposa, também idosa e com certa obesidade havia caído e ele não conseguia ajuda-la a se levantar. Depois de uma rápida observação de que nada mais grave tivesse acontecido com a queda, e com grande esforço foi possível coloca-la de pé. Sempre que ela tinha problemas de saúde que dependessem de locomovê-la através de maca muitas pessoas tinham que ajudar no transporte. Algumas vezes até mesmo o bombeiro auxiliava.

Assim eram os dias e os encontros de uma amizade que se estendeu por alguns anos e através dela tornei-me amigo da família.

Certo dia notei uma  movimentação atípica na casa. Era a esposa amada que havia sido internada e não mais retornou. Os dias que se seguiram em nossos encontros eram divididos com a grande tristeza de Fausto Maretti pela perda da companheira amada e assim os dias se passaram. Um bate papo e depois o auxilio para que ele subisse o degrau com seu andador.

Certo período, caminhando para os seus noventa e seis anos a saúde cobrou dele uma internação que durou alguns dias e não teve volta.

 Ao passar pelas imediações entre as Ruas Pernambuco e Av. Francisco Salles, próximo ao Asilo Vinhas do Senhor, tenho ainda a impressão deque vou  rever  uma andador na porta e o olhar entre os dedos entreabertos de Fausto Maretti. Uma  amizade gratuita e verdadeira que não se esquece: Venha cá e  mostre-me sua mão amigo del core!

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